Luto Migratório: Como Entender e Superar o Vazio da Saída do Brasil
Mudar de país é mais do que uma decisão prática , envolve perdas emocionais profundas que muitos brasileiros ignoram. Este texto aborda o luto migratório, um conjunto de dores simbólicas como a saudade da família, a perda do idioma, da cultura e do status profissional. Reconhecer essas emoções é essencial para se adaptar e reconstruir o pertencimento. Com apoio terapêutico, é possível transformar essa travessia em um processo de autoconhecimento e fortalecimento. Um convite ao acolhimento emocional na vida fora do Brasil.
Laura Hubeda
7/2/20255 min read
A maioria dos brasileiros que imigram busca, em países mais desenvolvidos, melhores oportunidades de trabalho e uma qualidade de vida superior. Porém, ao idealizar demais esse novo lar, deixamos de perceber desconfortos e perdas – os chamados lutos simbólicos – que, quando ignorados, podem nos levar à apatia e à sensação de vazio. Esses lutos simbolizam a ruptura de referências culturais e afetivas que sustentam nossa identidade e nossa forma de ver o mundo.
Sentir tristeza, insegurança e desconforto faz parte do processo de adaptação. Se você é brasileiro e deixou para trás família, amigos, costumes e sonhos de carreira, esse “aperto no peito” é natural. Com apoio profissional, essa transição pode se tornar mais leve e cheia de significado.
1. Você não está sozinho no luto migratório
Mudar de país é, antes de tudo, um processo de perdas. A saudade das manhãs com a família, o cheiro da comida da vovó, o sotaque que nos define: tudo isso faz falta. Psicólogos interculturais chamam isso de luto migratório – a combinação de perdas concretas (distância física, documentos, empregos) e simbólicas (identidade, pertencimento, referências culturais). Reconhecer esse luto é o primeiro passo para superar o choque inicial e criar raízes na nova terra.
2. Os sete tipos de luto migratório
Os sete lutos migratórios correspondem a perdas simbólicas que atravessam todo o processo de mudança de país, afetando profundamente seu senso de identidade e pertencimento. Vou explicar cada um deles como se estivéssemos em uma sessão, com exemplos do seu dia a dia:
1. Luto pela família e entes queridos
Você sente um aperto no peito toda vez que pensa em não poder abraçar seus pais, irmãos ou amigos de infância. Por exemplo, naquela festa de aniversário que você não pôde ir — o vazio que ficou é esse luto vivo pela convivência interrompida ebook - O que são os lu….
2. Luto pela língua materna
A dificuldade de se comunicar em um língua na qual não tem domínio pode trazer uma serie de angústias e constrangimentos. E mesmo para quem é fluente no idioma local, há momentos em que falta aquela expressão exata em português. Imagine querer contar uma piada ou uma memória afetiva e não encontrar as palavras certas — esse incômodo é o luto pela sua língua de origem.
3. Luto pela cultura
Sabe aquela sensação de estranhamento num costume que antes era natural, como o jeitinho brasileiro de cumprimentar com abraço e beijo? Ao ter que se adaptar a um aperto de mão mais formal, você vive o luto por tradições e valores que ficaram para trás.
4. Luto pela terra — cores, cheiros e paisagens
Você pode se pegar suspirando ao sentir falta do verde intenso das árvores aqui do Brasil, do cheiro da terra molhada ou do calor do sol do meio-dia. Essas sensações que alimentavam sua memória corporal são perdas reais na nova paisagem.
5. Luto pelo status social e profissional
Quando seu diploma ou experiência não é reconhecido, e você precisa refazer caminhos profissionais, surge o luto pela posição e pelos projetos que você deixou. Por exemplo, aquele emprego de gerente que você exercia e agora virou um trabalho completamente diferente, é o luto pelo seu status anterior.
6. Luto pelo contato com o grupo de pertencimento
Antes, você estava inserido em grupos de amigos, clubes e redes de apoio no Brasil. Agora, ao perceber que não faz parte dos círculos sociais locais, seja porque não conhece as regras não-ditas ou por diferenças culturais, você vive o luto de não se sentir acolhido em nenhum grupo.
7. Luto pela integridade física e segurança
Aqui entram os medos de discriminação, barreiras institucionais ou até riscos à saúde que você não enfrentava no Brasil. Por exemplo, a insegurança ao buscar atendimento médico em outro idioma ou o receio de ser tratado de forma diferente, isso simboliza o luto por sua sensação de segurança física anterior.
Cada um desses lutos pode surgir de forma isolada ou combinada, em diferentes momentos da sua trajetória migratória. Reconhecê-los com exemplos concretos ajuda a dar nome ao que você sente e é o primeiro passo para elaborá-los juntos em terapia, transformando essas perdas em oportunidades de reorganizar sua identidade e reconstruir seu senso de pertencimento.
3. Permita-se sentir antes de agir
Segundo o Modelo Dual do Luto, seu enfrentamento se dá em um movimento contínuo entre dois momentos:
Foco na perda
Você dedica tempo a reviver lembranças: visita mentalmente festas de família, relembra músicas que tocavam em casa e sente a saudade apertar o peito. Chorar as ausências e expressar a dor faz parte dessa etapa, pois permite reconhecer e validar o que foi perdido.
Foco na restauração
Você volta sua energia para reconstruir a vida no novo país: estabelece uma rotina matinal, faz um curso de inglês, explora bairros, convida um colega para um café e cria oportunidades para fazer novos amigos. Aqui, você aprende habilidades práticas e retoma o controle sobre o presente.
O equilíbrio entre esses polos é essencial:
Se você permanecer tempo demais preso ao foco na perda, corre o risco de estagnar em saudade e tristeza, o que prolonga o sentimento de desajuste e pode desencadear ansiedade ou depressão.
Se, por outro lado, você se lançar imediatamente ao foco na restauração sem dar espaço às emoções de luto, esse “salto rápido” pode gerar um vazio interno, pois as perdas não foram elaboradas.
A oscilação saudável entre sentir a dor e tomar ações concretas de adaptação potencializa a resiliência. Em consultório, trabalhamos para que você:
Reconheça e expresse sua dor de forma segura (foco na perda);
Defina metas pequenas e alcançáveis para sua nova rotina (foco na restauração);
Avalie regularmente onde está o seu equilíbrio e ajuste a estratégia conforme suas necessidades.
Esse processo guiado por um psicólogo intercultural ajuda você a navegar conscientemente entre lembrar do passado e investir no presente, acelerando a construção de um novo senso de pertencimento.
4. Estratégias que você pode começar hoje
Enquanto isso, algumas atividades terapêuticas podem te ajudar:
Comece um diário, escreva sobre suas experiências, pensamentos, medos e ambições. Sugiro que deixe o digital de lado e utilize papel e caneta assim você conseguirá se conectar ainda.
Escreva uma carta para quem ficou no Brasil, dizendo tudo o que sente. Enviar a carta pode ser uma forma bem autêntica de compartilhar sua vida com alguém importante para você, mas não enviar também pode ser uma opção.
Reserve momentos para revisitar tradições brasileiras: cozinhe uma receita típica, ouça músicas em portugués, participe de eventos brasileiros.
Aprenda algo novo na comunidade local: faça um curso para aprender a língua local, circule por diferentes locais, esteja aberto a novas experiências culturais.
Mas essas práticas, sozinhas, nem sempre bastam. Um olhar especializado vai ajudar você a entender por que certas emoções insistem em voltar e como transformar esse processo em oportunidade de crescimento.
5. Acolhimento e suporte terapêutico
No meu consultório, ofereço um acolhimento intercultural pensado especialmente para brasileiros que vivem no exterior.
Se você se reconhece em alguma dessas dores ou se sente travado na adaptação, vamos conversar. Agende uma sessão e descubra como o luto migratório pode ser também um caminho de autoconhecimento e fortalecimento.
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